11 anos sem Paulo Colina (1950 - 1999)


Meu companheiro Paulo Colina, poeta no claro e no escuro. Por Oswaldo de Camargo

A morte do poeta Paulo Colina leva-nos, a nós que o acompanhamos por quase duas décadas, a estas breves mas pertinentes reflexões sobre a finitude do ser humano e a inserção do artista no âmago de causas que, tocando-o, conduzem-no a incomum preocupação com o homem e o mundo. Paulo Colina foi não só um notável artista, mas também um autêntico agitador cultural. Foi com ele, mais Abelardo Rodrigues, Cuti (Luís Silva) e o escritor argentino Jorge Lescano que fundamos, em 1978, no Bar e Restaurante Mutamba, no Centro, o Grupo Quilombhoje, que hoje edita os "Cadernos Negros". Foi a Paulo Colina que deveu a notável atuação do escritor afro-brasileiro em duas Bienais Nestlé, a marcante divulgação fora da coletividade negra da produção poética de jovens escritores afro-brasileiros, com o premiado "Axé - Antologia Contemporânea da Poesia Negra Brasileira", da editora Global, em 1982. Paulo Colina foi autêntico escritor. Sua presença na União Brasileira de Escritores tornava-o apto a uma visão clara e objetiva da necessidade de o escritor negro inserir-se, sem perda de identidade, na vida geral da literatura do país. Gostava de nos ouvir, por eu ser mais velho (no mínimo 15 anos) e foi com Abelardo Rodrigues, poeta excelente de "Memória da Noite", nosso inseparável companheiro. Chegamos a ganhar o apelido de "Triunvirato"... Poeta lírico, social, poeta autêntico da Negritude, já tornada moderna após os caminhos abertos por Lino Guedes, em 1926, com "O Canto do Cisne Preto", ou Solano Trindade, cantor de "Poemas de Uma Vida Simples", de 1944, em Paulo Colina se acentuou, como em poucos autores da Negritude, a inquietação por uma estética que não fosse tão-só justificada ou medida pela quantidade de livros, mas o esteio para obras que perdurassem no tempo, por serem autênticas, elaboradas e sancionadas por uma alto sentido estético. Daí a pertinência destes versos que tiveram, e têm, justa fama: "Bastaria ao poema apenas/ a cor da minha pele? "Notável a caminhada de Paulo Colina, de sua estréia, com "Plano de Vôo", a "Armas como Beijos". Sua inquietação, nesta estrada, advinda da convicção de que arte não se improvisa, nem é tão-só sentimento e intuição. Há que armar-se, apetrechar-se para trazê-la ao território do perceptível, chamá-la à presença de quem a deseja produzir e distribuir. Daí, muitas vezes, nosso lembrar, em acesas discussões, do verso de Carlos Drumond de Andrade: "Trouxe a chave?". A prosa de "Fogo Cruzado", de 1979, forte e crua muitas vezes, teve sim prosseguimento, num romance que permanece inédito e foi lido e discutido em nossa casa, onde ficamos aquilombados durante toda uma noite comentando e fazendo observações sobre o texto coliniano. Atendeu a elas, sobretudo a respeito de esboçar-se com mais nitidez certos personagens do romance. Rescreveu-o, mas não chegou a nos mostrar a segunda versão. Provou, porém, que estava atento às possibilidades da "arte que talvez não seja ainda", mesmo que entusiasme o que a produziu.Muito se pode escrever sobre Paulo Colina, que na pia batismal recebeu o nome de Paulo Eduardo de Oliveira. Deixou sua marca nos livros que escreveu, deixou na sensibilidade e na consciência de inúmeros leitores. Agora é o momento de nos voltarmos ao que realizou como artista, com redobrada atenção. Foi homem com todos os conflitos de homem, foi artista, com missão assumida de melhorar o que estava fincado ao seu derredor, muitas vezes injusto e mal-afinado com o que deveria ser.


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